Fonte: Portal Fator Brasil
Por Reginaldo Gonçalves*
Smart Grid ou, em português, redes inteligentes, trata-se de um conjunto de tecnologias e de novas regulamentações governamentais, comumente atrelado ao consumo de energia elétrica, que vem ganhando cada vez mais espaço no cenário mundial.
Apesar de suas múltiplas possibilidades de aplicação, o conceito de Smart Grid ganha destaque ao proporcionar um novo jeito de olhar para o consumo de energia.
Você já pensou em abastecer seu veículo elétrico em pontos de abastecimento espalhados pela cidade e através de um número ou código, esse consumo vai direto para a sua conta de energia? Ou ainda ter informações reais do seu consumo de energia em cada hora do dia, possibilitando ter mais controle sobre o consumo e tarifas diferenciadas?
Em um primeiro momento, a smart grid inicia sua configuração com a instalação de medidores de energia elétrica inteligente – muito mais complexos que os leitores de consumo conhecidos hoje no mercado. Os medidores inteligentes são uma via bidirecional entre a concessionária e o consumidor final pois, com eles, a concessionária terá em mãos uma série de informações antes impossíveis de serem obtidas com os medidores comuns. Um exemplo disto é a possibilidade de saber que em determinado horário do dia foi consumido mais ou menos energia em cada casa, tornando o serviço mais inteligente e customizado.
Neste caso, o avanço tecnológico proporcionado pela Smart Grid traz em si, também questões éticas. Se, por um lado, ganhamos poder por meio do controle do uso da energia, de forma econômica e inteligente, do outro há um entrave, uma questão cultural que precisa ser muito bem discutida no Brasil. Com os medidores inteligentes as concessionárias terão em mãos informações em tempo real dos consumidores, tais como: o horário que há mais pessoas nas casas, quantos aparelhos de televisão estão ligados, quantos banhos foram tomados. O governo, junto às concessionárias, terá que encontrar uma saída para essa questão: manter a privacidade do consumidor pensando até que ponto esse verdadeiro “big brother elétrico” pode ir, sem deixar de garantir ao consumidor que essas informações não serão usadas de forma inadequada.
Falando ainda nas tecnologias que envolvem a Smart Grid, a automação, seja ela industrial, predial, residencial, de sistemas elétricos, é outro elemento fundamental que, integrado ao medidor inteligente, será capaz de programar diversas tarefas. Em um simples exemplo: programar a máquina de lavar roupa para que ela funcione às 3h da manhã porque nesse horário a tarifa é mais barata. Fora do País esse conceito é conhecido como Building Manager Energy, ou seja, gestão de energia em edificações.
Ainda dentro do segmento de automação, podemos abordar outro conceito: resposta à demanda. Este conceito consiste no controle da energia conforme o consumo da usina. Em outras palavras, em horários de pico - de 18h às 20h (horário em que as pessoas saem do trabalho, chegam em casa e tomam banho) – as empresas ou demais edificações e residencias poderiam diminuir seu consumo interno em determinados equipamentos, desta forma as usinas de energia e empresas de distribuição poderiam canalizar toda a energia para onde ela fosse mais exigida. Nesse período, os clientes pré-estabelecidos em contrato poderiam por exemplo diminuir ou parar o consumo de ar condicionado de seus corredores ou reduzir e desligar iluminações de corredores ou áreas que não fossem essenciais.
Outra possibilidade dentro da tecnologia da automação é a geração distribuída de energia, ou seja, os clientes poderiam ao invés apenas de consumir energia, também gerar energia limpa para seu consumo e fazer com que a energia excedente possa ser redistribuída. Uma casa poderia ter painéis de energia solar em seu telhado e alternar seu consumo entre energia solar e energia convencional, e assim a sua produção excedente de energia ao fim do mês poderia ser “vendida” para as concessionárias.
Estas são algumas das aplicabilidades da Smart Grid. É evidente que ainda temos muito a percorrer se comparado a países como EUA, China, Japão e Europa, que já possuem diversos sistemas implantados e estão com o conceito muito mais desenvolvido. Entretanto, o Brasil, em relação a esses países, tem um diferencial muito grande: a energia que geramos aqui é em sua grande maioria energia “limpa”, vem de nossa extensa bacia hidrográfica, enquanto outros países utilizam carvão, energia nuclear e energia termoelétrica para suprir o seu consumo.
Há quem possa dizer “mas com isso vamos precisar de mais usinas” - e, consequentemente, haveria um grande desequilíbrio ambiental com desmatamentos, alagamentos de regiões, mudanças de curso de rios, desapropriações etc. Porém, a ideia do Smart Grid é justamente o contrário: com o consumo de energia inteligente e eficiente, não precisaríamos mais de tantas usinas, mesmo com o iminente aumento do consumo da energia, o país passaria a consumir a energia de forma mais eficiente evitando principalmente os desperdícios.
No Brasil, esse conceito começa a engatinhar: A ANEEL ainda está em fase de regulamentação e testes com os medidores inteligentes junto a projetos de P&D com as concessionárias de energia. Por isso, acredito quem em cinco anos já teremos uma base sólida de medidores instalados, o que, consequentemente, puxará a implantação e a automação de sistemas elétricos e o gerenciamento de energia (predial ou residencial). Antes disso, enfrentaremos grandes desafios, como a regulamentação já citada e a infraestrutura de comunicação para que o sistema funcione de forma adequada, uma vez que nosso sistema de transmissão elétrico é relativamente antigo com mais de 30 anos e praticamente não dispõe de uma rede adequada de comunicação. São questões que devem ser discutidas.
*Reginaldo Gonçalves é gerente de produtos da NetService.