quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Preço da energia dispara e deixa o país entre os mais caros do mundo

A energia elétrica tem um impacto direto na vida da população e também na competitividade das empresas. 

Custos mais altos costumam pressionar a produção, resultando em aumento de preço dos produtos finais para os consumidores

Donaldson Gomes (donaldson.gomes@redebahia.com.br)

Imagine a situação. O contrato de aluguel venceu e o proprietário do imóvel está cobrando oito vezes mais pelo mesmo espaço. 

O que fazer? Mudar é a resposta natural. A indústria brasileira passa por situação parecida em relação ao custo da energia elétrica, com um agravante: não há para onde ir. 

Em dezembro do ano passado, o custo médio da energia elétrica para a indústria passou de R$ 292,7 por megawatt/hora (MW/h) para R$ 310 em maio e deve encerrar o ano ao preço de R$ 342, de acordo com dados de um estudo feito pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). 

E a projeção em dezembro de 2015 é que o valor seja aumentado para R$ 420. Ou seja, em dois anos, o custo da energia para a indústria será ampliado em 44%.


reajuste, provocado pela seca prolongada, deve colocar o Brasil no indesejável grupo dos quatro países com a energia mais cara do mundo, atrás apenas de Índia, Itália e Singapura. Atualmente, o país ocupa a oitava colocação em um ranking com 28 países.

Mas o cenário ainda é pior, uma vez que a pesquisa da Firjan leva em conta apenas os consumidores industriais que adquirem energia no chamado mercado cativo de energia, que é o mesmo em que estão os consumidores finais e onde os reajustes de preços são controlados pelo governo, através da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

No caso dos grandes consumidores que optaram pelo chamado mercado livre de energia, onde a negociação é feita diretamente entre empresas e produtores de energia, o céu, que nesse caso nada tem a ver com a ideia de um paraíso, é o limite.

“Imagine a situação de uma empresa, cujo contrato de energia está vencendo, parte para negociar um contrato novo e percebe que vai ter que pagar quatro, seis ou até oito vezes mais do que vinha pagando. Não é o tipo de aumento de custo que é fácil de absorver”, pondera o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres, Paulo Pedrosa.

Alternativa cara
O problema é que o período de seca prolongada no país reduziu o nível dos reservatórios de água, obrigando o governo a lançar mão de alternativas energéticas mais caras que a hidreletricidade para evitar um apagão de produção. Usinas térmicas à base de combustíveis fósseis, como petróleo e carvão, garantem a eletricidade a um custo cada vez mais alto. 

Para quem está no chamado mercado livre, o problema está na Lei de Oferta e Procura: os preços sobem porque há pouca disponibilidade de energia no mercado. 

A terceira parte do problema diz respeito ao grupo de indústrias em que os preços finais dos produtos fabricados dependem de quanto pagam pela energia, tal a quantidade de eletricidade que utilizam. 

São as eletrointensivas. Existem, aproximadamente, 408 no país, de acordo com o Ministério de Minas e Energia. Na Bahia são oito e enfrentam um cenário de incertezas quanto à renovação dos contratos de fornecimento com a Companhia Hidrelétrica do São Franciso (Chesf), válidos até o mês de junho de 2015. 

Se, no primeito momento, o problema energético parece conjuntural – reflexo apenas da estiagem – na análise mais profunda percebe-se que a situação é fruto de equívocos na política energética, aponta o diretor da Thimos Energia, Ricardo Savoya. “Não se imaginou que em algum momento teríamos uma dependência tão grande das termelétricas. Sempre se pensou nessas usinas para usos mais esporádicos”, explica Savoya. Por conta disso, muitas delas têm custos operacionais extremamente elevados, explica. 

Além disso, lembra, o governo federal contou com uma série de investimentos em energia eólica e muitos foram implantados com atraso. Em outros casos, o atraso foi na ligação dos empreendimentos ao Sistema Integrado Nacional (SIN). “Fizeram falta”, afirma Savoya, assim como investimentos em hidrelétricas que atrasaram.

Impacto negativo
“Acredito que a entrada de algumas hidrelétricas, nos próximos anos, que já deveriam estar gerando energia, vai trazer algum alívio”, diz. 

O coordenador do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado da Bahia, Marcos Galindo, define como difícil o cenário energético para a indústria baiana em 2015. “Aumentos de custos acabam tendo um impacto negativo sobre a produção e a expectativa para o próximo ano é de um aumento entre 20% e 35%”, destaca. 

Galindo acredita que a oferta de energia é fundamental para dar competitividade aos negócios. “Existem empreendimentos que precisam se instalar em uma determinada região. 

Nesses casos, o empreendedor se desdobra para conseguir o acesso à infraestrutura necessária naquele local. Acontece que, nos casos em que ele pode escolher, vai para locais onde há uma melhor oferta de infraestrutura”, explica Galindo, lembrando que a região Oeste é uma das que têm potencial para o desenvolvimento industrial, que depende da certeza de oferta de energia.

Segurança
“Nós temos um polo de algodão, que poderia ser beneficiado no Oeste e dar vazão ao estabelecimento de uma cadeia têxtil, mas não é isso o que acontece”, diz. Para ele, o país sofre pela falta de investimentos na diversificação das fontes energéticas e na oferta de um serviço de qualidade. 

“É tão importante ter acesso à eletricidade quanto saber que a oferta é confiável. O empresário precisa ter a certeza de que o risco natural que existe em qualquer tipo de empreendimento não será aumentado pela oferta de energia”, afirma Marcos Galindo. 

Paulo Pedrosa acredita que o país não pode ficar à mercê de intempéries, como a seca. “Nós defendemos que o país tenha uma política energética para a indústria”, diz, explicando que o custo do insumo poderia funcionar como um indutor de desenvolvimento, ou para afugentar, a depender das políticas para o setor.

consumidor final Segundo o diretor da Abrace, os brasileiros consomem três vezes mais energia quando compram produtos que pagando a conta de luz. Isso porque os elevados custos de produção que a indústria tem com a energia acabam embutidos no preço final dos produtos. 

E, no Brasil, a energia custa muito mais do que deveria, acredita Paulo Pedrosa.
 



Países oferecem incentivos de energia elétrica à indústria
Enquanto outros países, muitos em estágios de desenvolvimento mais avançado economicamente que o Brasil, oferecem incentivos no consumo de energia elétrica para as indústrias, o país caminha na contramão, aponta um estudo da Engenho Consultoria. 

Como exemplo, Estados Unidos, Reino Unido, França e Japão cobram menos de US$ 40 por um megawatt hora (MWh), enquanto a Holanda e a Itália, cobram US$ 50. 

No Brasil, a tarifa média é de US$ 80. Segundo o presidente da Abrace, Paulo Pedrosa, o governo deveria encarar os contratos com as empresas eletrointensivas como um exemplo e expandir o modelo para o restante do país, em lugar de colocá-lo em risco. 

“Os contratos de fornecimento da antiga Copene (que deu origem à Braskem posteriormente) com a Chesf foram fundamentais para viabilizar o Polo Petroquímico de Camaçari, mas também viabilizaram a Chesf”, lembra Pedrosa, ressaltando tratar-se de uma parceria positiva para a região Nordeste do país. 

Nesse caso, segundo ele, ajudou a viabilizar tanto o que hoje é o Polo Industrial de Camaçari, quanto a Chesf, que ganhou uma destinação para a energia produzida a partir das águas do Rio São Francisco. 

Pedrosa sugere que o custo da energia passe a ser tratado como parte da estratégia para o desenvolvimento do país. “Por que uma grande indústria se implantaria longe do mercado consumidor sem os incentivos?”, questiona, em relação à região Nordeste.

De acordo com os cálculos da consultoria Tendências, o fim do incentivo levaria a uma concentração das atividades das empresas, que proporcionam uma renda de R$ 16 bilhões para os municípios em que estão instaladas, como alguns baianos, em locais mais próximos de grandes mercados consumidores, a exemplos do Sudeste do país.